Base XV - Do hífen em compostos
Base XV
Do hífen em compostos, locuções e encadeamentos vocabulares
1.º Emprega-se o hífen nas palavras compostas por justaposição que não contêm formas de ligação e cujos elementos, de natureza nominal, adjetival, numeral ou verbal, constituem uma unidade sintagmática e semântica e mantêm acento próprio, podendo dar-se o caso de o primeiro elemento estar reduzido: ano-luz, arcebispo-bispo, arco-íris, decreto-lei, és-sueste, médico-cirurgião, rainha-cláudia, tenente-coronel, tio-avô, turma-piloto; alcaide-mor, amor-perfeito, guarda-noturno, mato-grossense, norte-americano, porto-alegrense, sul-africano; afro-asiático, afro-luso-brasileiro, azul-escuro, luso-brasileiro, primeiro-ministro, primeiro-sargento, primo-infeção, segunda-feira; conta-gotas, finca-pé, guarda-chuva.
Obs.: Certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente: girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista, etc.
2.º Emprega-se o hífen nos topónimos/topônimos compostos iniciados pelos adjetivos grã, grão ou por forma verbal ou cujos elementos estejam ligados por artigo: Grã-Bretanha, Grão-Pará; Abre-Campo; Passa-Quatro, Quebra-Costas, Quebra-Dentes, Traga-Mouros, Trinca-Fortes; Albergaria-a-Velha, Baía de Todos-os-Santos, Entre-os-Rios, Montemor-o-Novo, Trás-os-Montes.
Obs.: Os outros topónimos/topônimos compostos escrevem-se com os elementos separados, sem hífen: América do Sul, Belo Horizonte, Cabo Verde, Castelo Branco, Freixo de Espada à Cinta, etc. O topónimo/topônimo Guiné-Bissau é, contudo, uma exceção consagrada pelo uso.
3.º Emprega-se o hífen nas palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas, estejam ou não ligadas por preposição ou qualquer outro elemento: abóbora-menina, couve-flor, erva-doce, feijão-verde; bênção-de-deus1, erva-do-chá, ervilha-de-cheiro, fava-de-santo-inácio; bem-me-quer (nome de planta que também se dá à margarida e ao malmequer); andorinha-grande, cobra-capelo, formiga-branca; andorinha-do-mar, cobra-d’água, lesma-de-conchinha; bem-te-vi (nome de um pássaro).
4.º Emprega-se o hífen nos compostos com os advérbios bem e mal, quando estes formam com o elemento que se lhes segue uma unidade sintagmática e semântica e tal elemento começa por vogal ou h. No entanto, o advérbio bem, ao contrário de mal, pode não se aglutinar com palavras começadas por consoante. Eis alguns exemplos das várias situações: bem-aventurado, bem-estar, bem-humorado; mal-afortunado, mal-estar, mal-humorado; bem-criado (cf. malcriado), bem-ditoso (cf. malditoso), bem-falante (cf. malfalante), bem-mandado (cf. malmandado), bem-nascido (cf. malnascido), bem-soante (cf. malsoante), bem-visto (cf. malvisto).
Obs.: Em muitos compostos o advérbio bem aparece aglutinado com o segundo elemento, quer este tenha ou não vida à parte: benfazejo, benfeito, benfeitor, benquerença, etc.
5.º Emprega-se o hífen nos compostos com os elementos além, aquém, recém e sem: além-Atlântico, além-mar, além-fronteiras; aquém-mar, aquém-Pirenéus; recém-casado, recém-nascido; sem-cerimónia, sem-número, sem-vergonha.
6.º Nas locuções de qualquer tipo, sejam elas substantivas, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, não se emprega em geral o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa). Sirvam, pois, de exemplo de emprego sem hífen as seguintes locuções:
a) Substantivas: cão de guarda, fim de semana, sala de jantar;
b) Adjetivas: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho;
c) Pronominais: cada um, ele próprio, nós mesmos, quem quer que seja;
d) Adverbiais: à parte (note-se o substantivo aparte), à vontade, de mais (locução que se contrapõe a de menos; note-se demais, advérbio, conjunção, etc.), depois de amanhã, em cima, por isso;
e) Prepositivas: abaixo de, acerca de, acima de, a fim de, a par de, à parte de, apesar de, aquando de, debaixo de, enquanto a, por baixo de, por cima de, quanto a;
f) Conjuncionais: a fim de que, ao passo que, contanto que, logo que, por conseguinte, visto que.
7.º Emprega-se o hífen para ligar duas ou mais palavras que ocasionalmente se combinam, formando, não propriamente vocábulos, mas encadeamentos vocabulares (tipo: a divisa Liberdade-Igualdade-Fraternidade, a ponte Rio-Niterói, o percurso Lisboa-Coimbra-Porto, a ligação Angola-Moçambique) e bem assim nas combinações históricas ou ocasionais de topónimos/topônimos (tipo: Áustria-Hungria, Alsácia-Lorena, Angola-Brasil, Tóquio-Rio de Janeiro, etc.).
1 – No texto oficial, por lapso, “benção-de-deus”.
Base XXVIII
Emprega‑se o hífen nos compostos em que entram, foneticamente distintos (e, portanto, com acentos gráficos, se os têm à parte), dois ou mais substantivos, ligados ou não por preposição ou outro elemento, um substantivo e um adjectivo, um adjectivo e um substantivo, dois adjectivos ou um adjectivo e um substantivo com valor adjectivo, uma forma verbal e um substantivo, duas formas verbais, ou ainda outras combinações de palavras, e em que o conjunto dos elementos, mantida a noção da composição, forma um sentido único ou uma aderência de sentidos. Exemplos: água‑de‑colónia, arco‑da‑velha, bispo‑conde, brincos‑de‑princesa, cor‑de‑rosa (adjectivo e substantivo invariável), decreto‑lei, erva‑de‑santa‑maria, médico‑cirurgião, rainha‑cláudia, rosa‑do‑japão, tio‑avô; alcaide‑mor, amor‑perfeito, cabra‑cega, criado‑mudo, cristão‑novo, fogo‑fátuo, guarda‑nocturno, homem‑bom, lugar‑comum, obra‑prima, sangue‑frio; alto‑relevo, baixo‑relevo, belas‑letras, boa‑nova (insecto), grande‑oficial, grão‑duque, má‑criação, primeiro‑ministro, primeiro‑sargento, quota‑parte, rico‑homem, segunda‑feira, segundo‑sargento; amarelo‑claro, azul‑escuro, azul‑ferrete, azul‑topázio, castanho‑escuro, verde‑claro, verde‑esmeralda, verde‑gaio, verde‑negro, verde‑rubro; conta‑gotas, deita‑gatos, finca‑pé, guarda‑chuva, pára‑quedas, porta‑bandeira, quebra‑luz, torna‑viagem, troca‑tintas; puxa‑puxa, ruge‑ruge; assim‑assim (advérbio de modo), bem‑me‑quer, bem‑te‑vi, chove‑não‑molha, diz‑que‑diz‑que, mais‑que‑perfeito, maria‑já‑é‑dia, menos‑mal (=«sofrivelmente»), menos‑mau (=«sofrível»). Se, porém, no conjunto dos elementos de um composto, está perdida a noção da composição, faz‑se a aglutinação completa: girassol, madrepérola, madressilva, pontapé.
De acordo com as espécies de compostos que ficam indicadas, deveriam, em princípio, exigir o uso do hífen todas as espécies de compostos do vocabulário onomástico que estivessem em idênticas condições morfológicas e semânticas. Contudo, por simplificação ortográfica, esse uso limita‑se apenas a alguns casos, tendo‑se em consideração as práticas correntes. Exemplos:
- a) nomes em que dois elementos se ligam por uma forma de artigo: Albergaria‑a‑Velha, Montemor‑o‑Novo, Trás‑os‑Montes;
- b) nomes em que entram os elementos grão e grã: Grã‑Bretanha, Grão‑Pará;
- c) nomes em que se combinam simetricamente formas onomásticas (tal como em bispo‑conde, médico‑cirurgião, ): Áustria‑Hungria, Croácia‑Eslavónia;
- d) nomes que principiam por um elemento verbal: Passa‑Quatro, Quebra‑Dentes, Traga‑Mouros, Trinca‑Fortes;
- e) nomes que assentam ou correspondem directamente a compostos do vocabulário comum em que há hífen: Capitão‑Mor, como capitão‑mor; Norte‑Americanos, como norte‑americano; Peles‑Vermelhas, como pele‑vermelha; Sul‑Africanos, como sul‑africano; Todo‑Poderoso, como todo‑poderoso.
Limitado assim o uso do hífen em compostos onomásticos formados por justaposição de vocábulos, são variadíssimos os compostos do mesmo tipo que prescindem desse sinal; e apenas se admite que um ou outro o tenha em parte, se o exigir a analogia com algum dos casos supracitados ou se entrar na sua formação um vocábulo escrito em hífen: A dos Francos (povoação de Portugal), Belo Horizonte, Castelo Branco (topónimo e antropónimo; com a variação Castel Branco), Entre Ambos‑os‑Rios, Figueira da Foz, Foz Tua, Freixo de Espada à Cinta, Juiz de Fora, Lourenço Marques, Minas Gerais, Nova Zelândia, Ouro Preto, Ponte de Lima, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Santa Rita do Passa‑Quatro, São [ou S.] Mamede de Ribatua, Torre de Dona [ou D.] Chama, Vila Nova de Foz Côa. Entretanto, os derivados directos dos compostos onomásticos em referência, tanto dos que requerem como dos que dispensam o uso do hífen, exigem este sinal, à maneira do que sucede com os derivados directos de compostos similares do vocabulário comum. Quer dizer: do mesmo modo que se escreve, por exemplo, bem‑me‑querzinho, grande‑oficialato, grão‑mestrado, guarda‑moria, pára‑quedista, santa‑fèzal, em harmonia com bem‑me‑quer, grande‑oficial, grão‑mestre, guarda‑mor, pára‑quedas, santa‑fé, deve escrever‑se: belo‑horizontino, de Belo Horizonte; castelo‑vidense, de Castelo de Vide; espírito‑santense, de Espírito Santo; juiz‑forano, de Juiz de Fora; ponte‑limense, de Ponte de Lima; porto‑alegrense, de Porto Alegre; são‑tomense, de São [ou S.] Tomé; vila‑realense, de Vila Real.
Convém observar, a propósito, que as locuções onomásticas (as quais diferem dos compostos onomásticos como quaisquer locuções diferem de quaisquer compostos, isto é, por não constituírem unidades semânticas ou aderências de sentidos, mas conjuntos vocabulares em que os respectivos componentes, apesar da associação que formam, têm os seus sentidos individualizados) dispensam, sejam de que espécie forem, o uso do hífen, sem prejuízo de este se manter em algum componente que já de si o possua: América do Sul, Beira Litoral, Gália Cisalpina, Irlanda do Norte; Coração de Leão, Demónio do Meio‑Dia, Príncipe Perfeito, Rainha Santa; etc. Estão assim em condições iguais às de todas as locuções do vocabulário comum, as quais, a não ser que algum dos seus componentes tenha hífen (ao deus‑dará, à queima‑roupa, etc.), inteiramente dispensam este sinal, como se pode ver em exemplos de várias espécies:
- a) locuções substantivas: alma de cântaro, cabeça de motim, cão de guarda, criado de quarto, moço de recados, sala de visitas;
- b) locuções adjectivas: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho (casos diferentes de cor-de-rosa, que não é locução, mas verdadeiro composto, por se ter tornado unidade semântica);
- c) locuções pronominais: cada um, ele próprio, nós mesmos, nós outros, quem quer que seja, uns aos outros;
- d) locuções adverbiais: à parte (note‑se o substantivo aparte), de mais (locução a que se contrapõe de menos; note‑se demais, advérbio, conjunção, etc.), depois de amanhã, em cima, por certo, por isso;
- e) locuções prepositivas: abaixo de, acerca de, acima de, a fim de, a par de, à parte de, apesar de, aquando de, debaixo de, enquanto a, por baixo de, por cima de, quanto a;
- f) locuções conjuncionais: a fim de que, ao passo que, contanto que, logo que, por conseguinte, visto como.
Base XXIX
Emprega‑se o hífen em palavras formadas com prefixos de origem grega ou latina, ou com outros elementos análogos de origem grega (primitivamente adjectivos), quando convém não os aglutinar aos elementos imediatos, por motivo de clareza ou expressividade gráfica, por ser preciso evitar má leitura, ou por tal ou tal prefixo ser acentuado graficamente. Assim o documentam os seguintes casos:
1.°) compostos formados com os prefixos contra, extra (exceptuando‑se extraordinário), infra, intra, supra e ultra, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por vogal, h, r ou s: contra‑almirante, contra‑harmónico, contra‑regra, contra‑senha; extra‑axilar, extra‑humano, extra‑regulamentar, extra‑secular; infra‑axilar, infra‑hepático, infra‑renal, infra‑som; intra‑hepático, intra‑ocular, intra‑raquidiano; supra‑axilar, supra‑hepático, supra‑renal, supra‑sensível; ultra‑humano, ultra‑oceânico, ultra‑romântico, ultra‑som;
2.°) compostos formados com os elementos de origem grega auto, neo, proto e pseudo, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por vogal, h, r ou s: auto‑educação, auto‑retrato, auto‑sugestão; neo‑escolástico, neo‑helénico, neo‑republicano, neo‑socialista; proto‑árico, proto‑histórico, proto‑romântico, proto‑sulfureto; pseudo‑apóstolo, pseudo‑revelação, pseudo‑sábio;
3.°) compostos formados com os prefixos anti, arqui e semi, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por h, i, r ou s: anti‑higiénico, anti‑ibérico, anti‑religioso, anti‑semita; arqui‑hipérbole, arqui‑irmandade, arqui‑rabino, arqui‑secular; semi‑homem, semi‑interno, semi‑recta, semi‑selvagem;
4.°) compostos formados com os prefixos ante, entre e sobre, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por h: ante‑histórico; entre‑hostil; sobre‑humano;
5.°) compostos formados com os prefixos hiper, inter e super, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por h ou por um r que não se liga foneticamente ao r anterior: hiper‑humano; inter‑helénico, inter‑resistente; super‑homem, super‑requintado;
6.°) compostos formados com os prefixos ab, ad e ob, quando o segundo elemento começa por um r que não se liga foneticamente ao b ou d anterior: ab‑rogar; ad‑renal; ob‑reptício;
7.°) compostos formados com o prefixo sub, ou com o seu paralelo sob, quando o segundo elemento começa por b, por h (salvo se não tem vida autónoma: subastar, em vez de sub‑hastar), ou por um r que não se liga foneticamente ao b anterior: sub‑bibliotecário, sub‑hepático, sub‑rogar; sob‑roda, sob‑rojar;
8.°) compostos formados com o prefixo1 circum, quando o segundo elemento começa por vogal, h, m ou n: circum‑ambiente, circum‑hospitalar, circum‑murado, circum‑navegação;
9.°) compostos formados com o prefixo co, quando este tem o sentido de «a par» e o segundo elemento tem vida autónoma: co‑autor, co‑dialecto, co‑herdeiro, co‑proprietário;
10.°) compostos formados com os prefixos com e mal, quando o segundo elemento começa por vogal ou h: com‑aluno; mal‑aventurado, mal‑humorado;
11.°) compostos formados com o elemento de origem grega pan, quando o segundo elemento tem vida à parte e começa por vogal ou h: pan‑americano, pan‑americanismo; pan‑helénico, pan‑helenismo;
12.°) compostos formados com o prefixo bem, quando o segundo elemento começa por vogal ou h, ou então quando começa por consoante, mas está em perfeita evidência de sentido: bem‑aventurado, bem‑aventurança, bem‑humorado; bem‑criado, bem‑fadado, bem‑fazente, bem‑fazer, bem‑querente, bem‑querer, bem‑vindo;
13.°) compostos formados com o prefixo sem, quando este mantém a pronúncia própria e o segundo elemento tem vida à parte: sem‑cerimónia, sem‑número, sem‑razão;
14.°) compostos formados com o prefixo ex, quando este tem o sentido de cessamento ou estado anterior: ex‑director, ex‑primeiro‑ministro, ex‑rei;
15.°) compostos formados com os prefixos vice e vizo (salvo se o segundo elemento não tem vida à parte: vicedómino), ou com os prefixos soto e sota, quando sinónimos desses: vice‑almirante, vice‑cônsul, vice‑primeiro‑ministro; vizo‑rei, vizo‑reinado, vizo‑reinar; soto‑capitão, soto‑mestre, soto‑piloto; sota‑capitão, sota‑patrão, sota‑piloto;
16.°) compostos formados com prefixos que têm acentos gráficos, como além, aquém, pós (paralelo de pos), pré (paralelo de pre), pró (com o sentido de «a favor de»), recém: além‑Atlântico, além‑mar; aquém‑Atlântico, aquém‑fronteiras; pós‑glaciário, pós‑socrático; pré‑histórico, pré‑socrático; pró‑britânico, pró‑germânico; recém‑casado, recém‑nascido.
Base XXXII
É o hífen que se emprega, e não o travessão, para ligar duas ou mais palavras que ocasionalmente se combinam, formando, não propriamente vocábulos compostos, mas encadeamentos vocabulares: a divisa Liberdade‑Igualdade‑Fraternidade; a estrada Rio de Janeiro‑Petrópolis; o desafio de xadrez Inglaterra‑França; o percurso Lisboa‑Coimbra‑Porto.
1 – No texto oficial, por lapso, “com os prefixos”.
6 – Emprego do hífen (bases XV a XVII).
6.1 – Estado da questão
No que respeita ao emprego do hífen, não há propriamente divergências assumidas entre a norma ortográfica lusitana e a brasileira. Ao compulsarmos, porém, os dicionários portugueses e brasileiros e ao lermos, por exemplo, jornais e revistas, deparam-se-nos muitas oscilações e um largo número de formações vocabulares com grafia dupla, ou seja, com hífen e sem hífen, o que aumenta desmesurada e desnecessariamente as entradas lexicais dos dicionários. Estas oscilações verificam-se sobretudo nas formações por prefixação e na chamada recomposição, ou seja, em formações com pseudoprefixos de origem grega ou latina.
Eis alguns exemplos de tais oscilações: ante-rosto e anterrosto, co-educação e coeducação, pré-frontal e prefrontal, sobre-saia e sobressaia, sobre-saltar e sobressaltar; aero-espacial e aeroespacial, auto-aprendizagem e autoaprendizagem, agro-industrial e agroindustrial, agro-pecuária e agropecuária, alvéolo-dental e alvealodental, bolbo-raquidiano e bolborraquidiano, geo-história e geoistória, micro-onda e microonda; etc.
Estas oscilações são, sem dúvida, devidas a uma certa ambiguidade e falta de sistematização das regras que sobre esta matéria foram consagradas no texto de 1945. Tornava-se, pois, necessário reformular tais regras de modo mais claro, sistemático e simples. Foi o que se tentou fazer em 1986.
A simplificação e redução operadas nessa altura, nem sempre bem compreendidas, provocaram igualmente polémica na opinião pública portuguesa, não tanto por uma ou outra incongruência resultante da aplicação das novas regras, mas sobretudo por alterarem bastante a prática ortográfica neste domínio.
A posição que agora se adopta, muito embora tenha tido em conta as críticas fundamentadas ao texto de 1986, resulta, sobretudo, do estudo do uso do hífen nos dicionários portugueses e brasileiros, assim como em jornais e revistas.
6.2 – O hífen nos compostos (base XV)
Sintetizando, pode dizer-se que, quanto ao emprego do hífen nos compostos, locuções e encadeamentos vocabulares, se mantém o que foi estatuído em 1945, apenas se reformulando as regras de modo mais claro, sucinto e simples.
De facto, neste domínio não se verificam praticamente divergências nem nos dicionários nem na imprensa escrita.
6.3 – O hífen nas formas derivadas (base XVI)
Quanto ao emprego do hífen nas formações por prefixação e também por recomposição, isto é, nas formações com pseudoprefixos de origem grega ou latina, apresenta-se alguma inovação. Assim, algumas regras são formuladas em termos contextuais, como sucede nos seguintes casos:
a) Emprega-se o hífen quando o segundo elemento da formação começa por h ou pela mesma vogal ou consoante com que termina o prefixo ou pseudoprefixo (por exemplo: anti-higiénico, contra-almirante, hiper-resistente);
b) Emprega-se o hífen quando o prefixo ou falso prefixo termina em m e o segundo elemento começa por vogal, m ou n (por exemplo: circum-murado, pan-africano).
As restantes regras são formuladas em termos de unidades lexicais, como acontece com oito delas (ex-, sota– e soto-, vice– e vizo-; pós-, pré– e pró-).
Noutros casos, porém, uniformiza-se o não emprego do hífen, do modo seguinte:
a) Nos casos em que o prefixo ou o pseudoprefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por r ou s, estas consoantes dobram-se, como já acontece com os termos técnicos e científicos (por exemplo: antirreligioso, microssistema);
b) Nos casos em que o prefixo ou o pseudoprefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por vogal diferente daquela, as duas formas aglutinam-se, sem hífen, como já sucede igualmente no vocabulário científico e técnico (por exemplo: antiaéreo, aeroespacial).
6.4 – O hífen na ênclise e tmese (base XVII)
Quanto ao emprego do hífen na ênclise e na tmese mantêm-se as regras de 1945, excepto no caso das formas hei de, hás de, há de, etc., em que passa a suprimir-se o hífen. Nestas formas verbais o uso do hífen não tem justificação, já que a preposição de funciona ali como mero elemento de ligação ao infinitivo com que se forma a perífrase verbal (cf. hei de ler, etc.), na qual de é mais proclítica do que apoclítica.
Os compostos do tipo verbo + substantivo são geralmente hifenizados (ex.: corta-vento, guarda-roupa, lava-louça, tapa-olhos, etc.), como aliás se verifica no exemplário do ponto 1º. Em observação a este ponto, o texto do acordo prevê, no entanto, a queda do hífen em mandachuva e paraquedas, considerando que, nestes dois casos, se perdeu “a noção de composição”, contrariando assim a tradição lexicográfica (portuguesa e brasileira), que maioritariamente regista estes vocábulos hifenizados.